domingo, 13 de junho de 2010

Inside trading


Certa feita, estava dando aula na pós-graduação em Direito Penal da Universidade Estácio de Sá, quando a coordenadora do curso, Daniela Duque-Estrada, excelente criminalista (o elogio não é apenas por amizade, ela merece), entrou em sala para dar um aviso aos alunos. Papo vai, papo vem, ela comentou com os presentes que todos deveriam se informar melhor sobre o inside trading, tema que iria "entrar na moda". Claro que o aviso foi direcionado aos alunos, mas fiquei lá, estático, olhando para a turma com fingida cara de intelectual, sem ter a menor ideia do que se tratava. Desde então, prometi a mim mesmo fazer uma pesquisa e escrever algo sobre o assunto. Venho adiando o estudo por pura preguiça, mas hoje me senti inspirado (deve ser porque tive uma noite de insônia e, na falta de coisa melhor para ler, fui para internet buscando artigos interessantes). São apenas linhas breves. Decidi não me aprofundar muito na questão porque ela envolve conhecimento de mercados de capitais e eu sou semianalfabeto nisso. Haveria um grande risco de falar besteira.


Por inside trading entenda-se a operação em mercado de valores mobiliários, na qual o agente se vale de informação privilegiada (não disponibilizada ao público) para incrementar seu lucro. Cuida-se de conduta criminosa, prevista no art. 27-D da Lei nº 6.385/76, ora transcrito: “Utilizar informação relevante ainda não divulgada ao mercado, de que tenha conhecimento e da qual deva manter sigilo, capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiro, com valores mobiliários: pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa de até três vezes o valor da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime”. No tipo penal, percebe-se que o caráter sigiloso da informação é o traço característico do crime, aliado à intenção de locupletamento ilícito. O delito é formal, dispensando-se a efetiva obtenção da vantagem para que se repute consumado (note-se que a redação legal exige tão-somente a capacidade de propiciar ganhos ao insider ou a terceiros). Entendo se cuidar de crime próprio, pois o conhecimento da informação e o dever de sigilo, tal qual se infere da redação típica, são inerentes à profissão desempenhada pelo sujeito ativo (gestores, controladores, membros de conselhos etc. - ou seja, não se trata de uma informação que casualmente chegou ao conhecimento do sujeito ativo, mas sim que foi a ele profissionalmente confiada).


Deve ser ressaltado que, no mercado, o termo inside trading é usado não apenas para denominar o uso indevido de informações privilegiadas, mas também toda operação em que tomem parte controladores, administradores e funcionários de setores estratégicos de uma empresa, sendo sua análise determinante para que muitos investidores façam suas opções de negócios. Por exemplo, a opção de compra realizada pelo gestor de uma empresa pode nortear a atividade de um aplicador, e isso é absolutamente legal. Entretanto, como não entendo patavinas de ações e tenho uma relação conturbada com o direito empresarial, prefiro me limitar ao crime.


No ano passado, o Ministério Público Federal ofereceu a primeira denúncia no Brasil pela prática deste delito. O caso versa sobre a compra de ações da Perdigão na bolsa de Nova York por executivos da Sadia e do ABN-Amro Bank. Na época, a Sadia preparava uma oferta pelo controle acionário de sua concorrente, o que levou os autores, que participavam da formulação da proposta, a adquirirem os papéis antes do seu anúncio. Depois da publicidade da oferta houve a valorização das ações, mas os executivos, assim que souberam que a Perdigão rejeitaria o negócio, venderam os lotes adquiridos, obtendo vultosa quantia em contrapartida.


Nesses casos, é sempre importante a atuação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão regulador e fiscalizador das operações em bolsa de valores, como coadjuvante na arrecadação do suporte probatório necessário à comprovação do delito. Apesar disso, torna-se evidente a necessidade de uma intervenção mais precisa do Governo sobre os mercados de capitais, prevenindo e combatendo ilícitos afins.

Na forma da lei, mas nem tanto


Terça-feira estreia na Globo o seriado "Na forma da lei". Vou me abster de comentar a sinopse, mas posso adiantar que a narrativa é centrada em um grupo de profissionais da área do direito, às voltas com um assassino serial. Dentre as personagens, está uma delegada da Polícia Civil do Rio de Janeiro, interpretada por Luana Piovani.

Beleza, mas o que isso tem a ver com o blog? Ocorre que hoje o jornal O Globo publicou uma foto da personagem. Nela, Piovani aparece portando um fuzil e vestindo um colete à prova de balas, que apresenta um brasão... da Polícia Militar! Admito que o povo, em geral, possa ter dificuldades em separar as atribuições das duas polícias. Mas a Globo? Custa fazer uma pesquisa jurídica mais apurada? Tenho medo do que vem por aí... muito medo!