domingo, 30 de agosto de 2009

Estatuto do idoso: nova definição para as infrações penais de menor potencial ofensivo?


"Lei 10.741/2003: Crimes contra Idosos e Aplicação da Lei 9.099/95 - O Tribunal iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Procurador-Geral da República contra a expressão “exceto nos serviços seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos serviços regulares”, constante do caput do art. 39, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), que assegura aos maiores de 65 anos a gratuidade dos transportes coletivos públicos e urbanos e semi-urbanos, e do art. 94, do mesmo diploma legal, que determina a aplicação, aos crimes tipificados nessa lei, cuja pena máxima privativa de liberdade não ultrapasse 4 anos, do procedimento previsto na Lei 9.099/95, e, subsidiariamente, no que couber, as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal. Preliminarmente, o Tribunal não conheceu da ação relativamente ao art. 39 da lei impugnada, por já ter se pronunciado pela constitucionalidade desse dispositivo quando do julgamento da ADI 3768/DF (DJE de 26.10.2007). Em seguida, a Min. Cármen Lúcia, relatora, julgou parcialmente procedente o pedido formulado para dar interpretação conforme a Constituição ao art. 94 da Lei 10.741/2003, no sentido de que, aos crimes previstos nessa lei, cuja pena máxima privativa de liberdade não ultrapasse 4 anos, aplica-se o procedimento sumaríssimo previsto na Lei 9.099/95, não se admitindo interpretação que permita aplicação benéfica ao autor do crime cuja vítima seja idoso. Asseverou que, se interpretada a norma no sentido de que seriam aplicáveis aos crimes cometidos contra os idosos os benefícios da Lei 9.099/95, a lei impugnada seria inconstitucional, haja vista a possibilidade de, em face de um único diferencial, qual seja, a idade da vítima do delito, ter-se, por exemplo, um agente respondendo perante o Sistema Judiciário Comum e outro com todos os benefícios da Lei dos Juizados Especiais, não obstante a prática de crimes da mesma gravidade (pena máxima não superior a 4 anos). Assim, estabelecendo que seria aplicável apenas o procedimento sumaríssimo previsto na Lei 9.099/95 aos crimes mencionados, o idoso seria, então, beneficiado com a celeridade processual, mas o autor do crime não seria beneficiado com eventual conciliação ou transação penal. Em divergência, o Min. Eros Grau julgou improcedente o pleito, por reputar, tendo em conta não ter sido apontada, na inicial, a violação a nenhum preceito constitucional, não caber ao Supremo o exercício do controle da razoabilidade e da proporcionalidade das leis. Após, pediu vista dos autos o Min. Carlos Britto. ADI 3096/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 19.8.2009. (ADI-3096)"

Ao elaborar o Estatuto do Idoso, o legislador pátrio tencionou conferir instrumentos mais eficientes de proteção aos direitos das pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, garantindo-lhes prioridades não concedidas aos demais cidadãos (art. 3º, p. único, da Lei nº 10.741/03). Imbuído desse espírito, o art. 94 preconiza a aplicação do procedimento previsto na Lei nº 9.099/95 aos crimes previstos no Estatuto. Ou seja, o dispositivo visa a dar celeridade às ações penais referentes a crimes contra os idosos, com a adoção de um rito sumaríssimo. Evidentemente, a remissão à Lei nº 9.099/95 não abrange os institutos despenalizadores. Seria de uma incoerência quase esquizofrênica entender cabível a transação penal, por exemplo, ao crime de induzir pessoa idosa sem discernimento a outorgar procuração, infração cuja pena máxima cominada abstratamente não ultrapassa o patamar de quatro anos de reclusão. É sabido que os institutos despenalizadores da Lei dos Juizados Especiais somente podem ser aplicados aos crimes com pena máxima igual ou inferior a dois anos. No Estatuto, o legislador teve por objetivo reforçar a proteção aos idosos, não diminuí-la, o que aconteceria em caso de extensão dos efeitos despenalizadores aos crimes referidos no art. 94. Entretanto, por mais que me pareça óbvia tal interpretação, tão logo o Estatuto entrou em vigor, surgiram outras duas posições, a saber:

(a) não só o procedimento, mas também os benefícios previstos na Lei nº 9.099/95 podem ser aplicados aos crimes previstos no Estatuto;
(b) a fim de se preservar o princípio da isonomia, deve-se interpretar o disposto no art. 94 como alterador do conceito de infração de menor potencial ofensivo, que passa a incorporar todo crime ou contravenção com pena máxima igual ou inferior a quatro anos.

Por isso, parece-me perfeita a posição da Min. Cármen Lúcia, para quem o texto legal deve ser interpretado teleologicamente.

Em tempo: o Min. Eros Grau afirma que o STF não pode avaliar a proporcionalidade das leis. Em que pese o devido respeito ao Ministro, ele está redondamente enganado (ao menos no que tange ao Direito Penal). O princípio da proporcionalidade das penas está implícito no princípio da individualização da pena (art. 5º, XLVI, CF). Ou seja, trata-se de direito fundamental do indivíduo. Ademais, leis criadas sob o crivo da desproporcionalidade ferem o princípio do devido processo legal substantivo. Portanto, o STF não pode se eximir de sua apreciação.

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